30 de setembro de 2008

Olhos nos olhos

7.30, estou á porta de um cliente de longa data, hoje vou leva-lo ao Algarve mais propriamente a Lagoa.
Numa tentativa de melhorar a sua situação de visão e depois da propaganda que fizeram a Cuba e aos melhoramentos que algumas pessoas conseguiram, decidiu ele também tentar a sua sorte.
Porque tem uma situação financeira estável não lhe foi concedido o mesmo que a outros, o transporte, a alimentação e a consulta pagas, em muitas camaras municipais assim aconteceu e Santarém não foi excepção.
Varadero, Fidel e charutos são palavras que estou habituado a ouvir por outras razões, mas hoje o encontro de ideias sobre Cuba tinha a ver com a sua capacidade de visão, uma vista a ver a 50% a outra a caminhar para a perda total.
Durante anos andou a ser seguido numa clínica de Lisboa, com o passar dos tratamentos que lá fez e sem recuperar quase nada veio o perder de todas as esperanças, hoje tinha outra vez motivo para se animar e quem sabe de voltar a ler um simples jornal ou mesmo perceber as imagens transmitidas por uma televisão.
O seu estado de ansiedade era tanto que sentado ao meu lado inclinava-se para a frente a tentar perceber em que sitio estávamos, perguntava várias vezes as horas e quantos kms faltavam.
A consulta era ao meio dia em Lagoa, aconselhado por mim a sair por volta das 9 horas pois 3 horas de viagem chegavam perfeitamente, preferiu sair ás 7.30, compreendi perfeitamente este estado de nervosismo, estava apenas a meia dúzia de horas e a 320 km de distancia de saber se podia ou não ir a Cuba.
Portagem de Paderne.

Estamos quase Luis!!
Estamos sim Sr. Rafael, faltam pouco mais de 20 kms


Notei que a sua voz saiu embargada e que os seus olhos tinham uma ligeira humidade, deixava perceber que estava emocionado.
Parque Empresarial de Lagoa em frente á Fatacil, uma parede branca com umas letras a azul era ali o nosso destino, I-QMED.
Apressou-se a sair, dei a volta ao carro e agarrei-me ao seu braço, dirigimo-nos á entrada e fomos recebidos por uma senhora com sotaque mas num português muito bem articulado.

O Sr. é...?
Muito mais calmo lá disse o seu nome e de onde vinha.
Chegou muito cedo e o Dr. ainda não está cá, a sua consulta é só ao meio dia, são apenas 10.40.
O Dr. Versteeg acabou por chegar e com ele a hora da consulta, todas as expectativas, todos os seus sonhos estavam na mão daquele homem.
Cá fora esperando pelo fim da consulta fui vendo algumas pessoas saírem, uns de olhos tapados outros de óculos escuros mas todos com a esperança de ver muito melhor.
13.40, fui chamado pela senhora que nos tinha recebido, mandou-me seguir em frente e cortar á direita.
Senti-me nervoso, penso até que fiquei com medo de o ir buscar.
Estava ali á minha frente e tinha uma expressão de dor e de angustia, não perguntei nada e mantive-me em silencio, de cabeça baixa e novamente com a voz embargada disse o que eu não esperava ouvir.

"não há nada a fazer Luis"

Pediu-me apenas se não me importava de parar só em casa, fomos com alegria e expectativa, regressamos com a certeza que mais tarde ou mais cedo o que ele mais temia iria por acontecer, a cegueira.

24 de setembro de 2008

Tristeza

Se apanho alguns serviços que me dão vontade de rir pelo caricato da situação, outros há que me dão vontade de gritar em sinal de protesto e revolta.
Pela manhã apanhei um serviço daqueles que ninguém consegue passar indiferente, transportei uma mulher que por falta de condições monetárias ia entregar a sua filha ao lar da Santa casa da Misericórdia.

Será que alguém merece ser afastado da sua família por falta de dinheiro?


Não sei, não quero e nem consigo imaginar o que me custaria afastar de um filho meu.

19 de setembro de 2008

O troco






O transito estava complicado, talvez por ser sexta feira e ainda para mais hora de ponta, o relógio do meu carro marcava 8h15m.
Depois de começar ao trabalho bem cedo e já com alguns serviços efectuados, eis que me entra no carro uma rapariga bem vestida, cheirosa e sobretudo bonita, leve-me à zona industrial à DET (Desenvolvimento Empresarial Tecnológico) coloquei o carro a trabalhar iniciei a marcha mas não consegui evitar uma olhadela pelo espelho retrovisor, era de facto bonita, foi-me difícil desviar o olhar e concentrar-me na estrada.
Hoje ainda chove minha senhora, disse-lhe, não foi muito original mas foi uma tentativa honesta de a pôr a falar comigo.
É capaz, da maneira que está o céu ainda hoje caiem alguns pingos, respondeu-me, mais uma frase original e... toca a porcaria do telemóvel.
Do outro lado pelo que percebi era alguém que estava num patamar superior ao seu, talvez o "manda chuva", não o que hoje iria fazer chover mas o patrão, trocaram alguns comentários falaram de negócios, de dinheiros, de vendas.
A DET estava ali mesmo á frente e a minha hipótese de lhe arrancar mais algumas palavras acabava ali, parei o carro desliguei o taxímetro e fazendo um movimento ligeiro olhei para trás para a admirar mais uma vez e disse-lhe, são 4.70€ , rebuscando na sua carteira, apanhou uma nota de 5€, olhe fica assim e passe-me uma factura de 15€.
Não sei se demorei muito se pouco tempo a reagir, não consegui dizer quase nada porque estava mesmo parvo com a situação, a senhora bem vestida, cheirosa e bonita afinal não passava de mais uma pessoa comum, queria ganhar o dia á conta do taxista que tinha ficado de beiço pendurado com tamanha beleza.
Quinze euros? a senhora não acha que isso é demais? Não se preocupe, que eles pagam.
E eu lá estava preocupado se "eles" pagavam, eu estava era a sentir-me usado, abusado e sei lá mais o quê, ela iria ganhar mais numa simples factura do que eu a fazer o meu serviço.
Os seus colegas não têm problema nenhum em me passar a factura, pois..., eu também não tinha, bastava escrever 15 em vez de 5, mas queira desculpar que eu não o vou fazer, acho que é uma quantia muito elevado para o tipo de serviço que acabei de fazer.
Então despache-se lá a passar-me a factura que tenho mais que fazer.

Sinceramente que me apeteceu rir, até aqui falava que nem uma princesa, agora tinha acabado de mostrar o que realmente era, não ri mas apressei-me a passar a factura dos 5 euros e sem dizer mais nada dei-lha a factura e virei-me para a frente.

Então o troco?
O troco? qual troco?
Não eram quatro euros e setenta?


O que se diz a uma pessoa numa altura destas? eu não ficava mais rico por ela me dar os 30 cêntimos de gorjeta, ela não ficava mais pobre por mos ter dado, mas bastou não lhe fazer a vontade para ser o pior taxista ao cimo da terra.

Esta vida não é fácil.

13 de setembro de 2008

Ao ver a lista



Ao ver a lista, é uma expressão que me fui habituando a ouvir cada vez que passa o cauteleiro que frequenta a praça de táxis. Nunca percebi muito bem o significado deste dito, ontem e no fim de tantas interrogações decidi perguntar ao Amilcar cauteleiro o que queria dizer o " Ao ver a lista" .
Entre uma e outra cautela vendida aos taxistas que tentam a sua sorte, lá me foi explicando que o "ao ver a lista" era uma expressão utilizada por ele e por outros antigos vendedores da sorte para anunciar que tinha a lista dos premiados de lotarias anteriores.
Já dei duas vezes a grande, e segundos prémios já não há conta, disse-me a sorrir, alguém lá do fundo e no mesmo tom com que ele apregoava a sorte, gritou, olhó ó vigarista, mais uma que se ouvia frequentemente cada vez que ele passava , não me incomoda, afinal só compra quem tem dinheiro e os tesos ficam-se pela conversa.
Tá tudo branco dizia outro, branco tás tu que não apanhas sol
, entre os mimos que se ouviam de parte a parte, o que é certo é que vendia jogo que nunca mais acabava, alguns dos que compravam já tinham números certos, para esses já nem era preciso alicia-los, toma lá dá cá, ía a cautela e vinha o dinheiro para o seu bolso.
Num olhar ameaçador como que fosse uma obrigação comprar-lhe uma cautela, perguntou-me, atão e tu? eu não jogo, fico-me pela sorte dos meus colegas. Não tardou que me presenteasse com um poema.

tu que não compras uma cautela
só te posso dizer o seguinte
tira-me essa farpela
porque não passas de um pedinte


Improvisado ou já pensado o que é verdade é que havia poemas para todos os gostos, para quem comprasse, para quem passava e lhe mandasse bocas e até para mim que só quis saber o que queria dizer,
"Ao ver a lista".

A todos os vendedores de sonhos que andam por aí, um grande abraço.


8 de setembro de 2008

Próxima paragem

Estava em pé no meio do passeio à espera do próximo cliente, a rádio na TSF como habitualmente informava que havia médicos a limpar 2500€ por dia em hospitais públicos... estudasses... pensei para comigo.
Mais alguns minutos de espera e um casal de meia idade dirige-se a mim, queriam passar no Hotel Santarém para depois seguirem para almoçar.
Abri a porta de trás, sentaram-se, dei a volta ao carro, liguei o taxímetro e iniciei o trajecto até ao local que me indicaram, pelo caminho uma breve conversa sobre o tempo, sobre as obras que se fazem sentir na cidade e de onde vinham. Fiquei a saber que eram de Chaves, estavam na cidade ia para dois dias e ficavam mais dois.
Queriam saber onde era a Igreja do Santíssimo Milagre e se valia a pena conhecer, disse que sim e que pela quantidade de pessoas que vinham visitar devia ser um local a não perder.
Deve ser um local a não perder? perguntou a senhora, mas então o sr. não conhece?
Bonito trabalho, e não é que não conheço mesmo, algum silencio da minha parte interrompido apenas com um "deixe-nos no hotel que depois pedimos para alguém nos levar" o resto do caminho foi feito com o pensamento no Santíssimo Milagre e como é que um nascido e criado na terra não conhece a sua história?
Próxima Paragem, Santíssimo Milagre

7 de setembro de 2008

Arre burro

Pode pensar-se que irei falar de táxis, mas não, vou falar de burros, melhor, vou falar de burros de táxis, de blogs e do meu reaparecimento (vamos a ver se é desta).
Mijas, é um pueblo Espanhol que fica situado na Costa del Sol tem como atracção principal os burrostáxis, meus colegas portanto.
De todos os táxis do mundo estes são sem duvida os táxis mais económicos, "Gasóleo não precisam, oficina nem falar! ..." não sofrem com a crise do petróleo, não têm que ir à inspecção, e o que poluem é devidamente aproveitado para embelezar os jardins lá do sitio.

O burro nunca foi tão utilizado como agora, e se algum dia esteve em vias de extinção as variadíssimas formas de utilizar o seu nome, fizeram com que esses dias já fizessem parte da história.
Podemos encontrar o burro em vários sítios na internet mas aqueles que mais me surpreenderam foi a quantidade de blogs que fazem do burro o ícone principal.

http://opaisdoburro.blogspot.com/
http://arremacho.blogspot.com/
http://entramula.blogspot.com/
http://orgulhoburriqueiro.blogspot.com/
http://jumento.blogspot.com/
http://souburro.blogspot.com/
http://coisas-do-burro.blogspot.com/
http://vozesdeburros.blogs.sapo.pt/
Estes são alguns dos tais "burros" que encontrei sem dificuldade, outros mais andarão por aí e outros tantos terão tendência a aparecer, é sem duvida um animal a venerar já que dá a tanta gente a vontade de escrever.

Por fim o meu rereaparecimento, é verdade que já vim, já fui, voltei a ir e desta vim para ficar, até me ir embora outra vez...
Como tenho um aliado de força, O Burro, talvez me aguente cá mais tempo quanto mais não seja para ver outros burros a olharem para mim.
Para que a coisa funcione de vez comprei outro carro, desta vez vou ganhar dinheiro a sério, vou conseguir fugir aos impostos, a não ser que o governo me vá cobrar impostos da merda que o meu carro faz, desculpem do meu burro.